Em 2012, o ministério transferiu do Fundo Nacional de Saúde pelo menos R$ 29 milhões por meio de cheques, sem a identificação de quem recebeu o dinheiro. Embora o relatório não tenha apontado a ocorrência de dano aos cofres públicos nesse caso, a prática é proibida pelo Decreto nº 7.507, de 2011, que disciplina as transferências financeiras entre União, estados e municípios, justamente por dificultar o controle.
Analisando os dados disponíveis no portal Saúde com Mais Transparência, mantido pelo próprio ministério, a CGU também encontrou uma série de “despesas incomuns”. Segundo o texto, são gastos “não previstos na legislação ou que não fossem notadamente vinculados à área da saúde”. Ao todo, foram encontrados 733 transferências do tipo, totalizando R$ 845 mil. Entre os gastos apontados, estão 32 movimentações para pagamento de tevê por assinatura, no valor de R$ 3,4 mil, e duas para o pagamento de mensalidades de clubes, no valor de R$ 70, em 2012.
Danos ao erário
Entre as irregularidades que teriam causado dano aos cofres públicos, segundo o relatório da CGU, a principal foi a realização de três pagamentos ao Laboratório Francês de Biotecnologia (LFB), totalizando R$ 2,3 milhões, após o fim do contrato do ministério com a empresa. Os repasses dos valores ocorreram em junho de 2012, mas o contrato com a empresa francesa havia encerrado no começo de 2010. Além disso, aponta a CGU, os termos do acordo deveriam ter sido precedidos de uma análise das pendências da empresa com a administração pública, já que o Ministério da Saúde tinha conhecimento de “diversas irregularidades cometidas pela LFB, as quais indicariam débitos em valores superiores aos dessas despesas”. O Brasil possui hoje cerca de 15 mil pacientes hemofílicos que dependem desse tipo de material.
Os eventos foram outra fonte de dor de cabeça para o ministério em 2012. Durante a 12º Mostra Nacional de Experiências Bem-Sucedidas em Epidemiologia, prevenção e Controle de Doenças (12ª Expoepi), por exemplo, os gastos indevidos chegaram, de acordo com a CGU, a R$ 2 milhões. O montante inclui pagamentos por serviços não prestados ou fornecidos em quantidade menor que o acordado, como estandes montados em tamanho menor que o estabelecido ou profissionais contratados por mais tempo que o necessário. O evento, realizado em outubro de 2012 em Brasília, consumiu cerca de R$ 8 milhões, e foi realizado pela GV2 Produções. Só com a “terceirização” da locação do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, o Ministério da Saúde deixou de economizar cerca de R$ 600 mil.
Por fim, a CGU apontou também irregularidades na licitação para compras de ambulâncias do Samu, em 2012. O ministério incluiu, no edital, os gastos com a manutenção das unidades durante o primeiro ano de funcionamento, elevando os preços das propostas oferecidas. Entretanto, como diz o relatório, “não foram apresentadas quaisquer evidências de que os donatários das ambulâncias receberam a orientação sobre o pagamento antecipado por essas revisões, tampouco de que existem controles ou atestados da execução desses serviços pelas montadoras”. O gasto a mais, incorporado na licitação, acabou indo parar na conta do contribuinte: “Estima-se um dano potencial ao erário de R$ 922.360, que corresponde ao valor da primeira revisão dos veículos adquiridos”, descreve o documento.
Sobre os gastos da 12ª Expoepi, o Ministério da Saúde lançou nota esclarecendo que “obteve o ressarcimento de R$ 256 mil referentes aos serviços de hospedagem, gráfica e telas para projeção em julho de 2013. Ainda em 2013, o Ministério da Saúde encaminhou à corregedoria da pasta pedido para a instauração de processo para apurar responsabilidades e o real prejuízo à União — que será devidamente cobrado pelo ministério”. Relatórios de auditoria, como os elaborados pela CGU, servem de subsídio para o julgamento das contas da pasta no Tribunal de Contas da União. O relatório inclui respostas do Ministério da Saúde a todos os questionamentos da CGU, mas não emitiu notas à empresa.
As falhas
Confira as principais irregularidades apontadas pela Controladoria-Geral da União na Secretaria Executiva do Ministério da Saúde em 2012
– Pagamentos irregulares ao Laboratório Francês de Biotecnologia (LFB) para a compra de hemoderivados. Os repasses ocorreram vários meses depois do fim do contrato do ministério com a empresa. Possível dano ao erário: R$ 2,3 milhões
– Descontrole nos gastos durante a realização de feira institucional, em outubro. As irregularidades apontadas pela CGU estão espalhadas por todo o evento. Vão desde a contratação de serviços, como recepcionistas e editores de vídeo, até a montagem dos estandes da feira. Possível dano ao erário: R$ 1,4 milhão
– Irregularidade nas licitações de compras de ambulâncias do Samu. O edital previa o pagamento antecipado por revisões e manutenções no primeiro ano de funcionamento dos veículos, mas normas do próprio ministério estabelecem que essas despesas cabem aos municípios e aos estados que recebem as ambulâncias. Possível dano ao erário: R$ 922 mil
– Contratação indireta do Centro de Convenções Ulysses Guimarães: o Ministério da Saúde “terceirizou” para uma produtora de eventos a locação do espaço onde foi realizada a 12ª Expoepi, em outubro de 2012. O gasto teria sido menor se a Secretaria de Turismo do DF tivesse sido contratada diretamente. Possível dano ao erário: R$ 630 mil
Total: R$ 5,2 milhões