Como os médicos se preparam para dizer as más notícias aos seus pacientes

 O diagnóstico não é favorável. Existe a melhor forma de contar a má notícia e como sobreviver a essa difícil tarefa?

Entre as tarefas de um médico está comunicar um diagnóstico que ninguém gostaria de ouvir. A confirmação de um câncer, o um resultado positivo para contaminação pelo Vírus HIV/Aids ou mesmo a comunicação do estágio terminal de um paciente estão entre as mais difíceis lições na vida de um médico. E que, nem sempre, se aprendem só nos livros.

A oncologista Elza Gonçalves de Carvalho, 33, que atua no hospital Santa Júlia, afirma que a sua primeira aula sobre como lidar com a situação aconteceu na prática. “Não somos treinados para isso na faculdade e nem na residência. Na verdade, como é uma situação delicada, precisamos ouvir o que o paciente sabe e contar o diagnóstico por partes. Jamais devemos dar a notícia de uma vez”. Mais tarde, a oncologista fez um curso complementar psicológico. “Graças a Deus fiz esse curso! Depois do diagnóstico, muitas vezes tenho que falar da vida terminal do paciente”, salienta.

De acordo com a oncologista, depois que o paciente entende que ele precisará mudar drástica e negativamente a sua vida e, na maioria dos casos, percebe que seu futuro também está comprometido, a reação mais natural é o choro. “Devemos explicar a doença aos poucos antes de contar de fato o que ele tem, porque cinco minutos depois que são informados de um câncer, por exemplo, o paciente não escuta mais nada. Ele simplesmente chora”, explica a especialista Elza Gonçalves.

Esconder

O código de ética médica, desde 1847 já declarava: “A vida de uma pessoa doente pode ser diminuída não apenas pelos atos, mas também pelas palavras ou maneiras do médico. Isto é, portanto, uma obrigação sagrada a de guardá-lo cuidadosamente a este respeito e evitar todas as coisas que tenham a tendência de desencorajar o paciente e deprimir seu espírito”.

A doutora em Psicologia Karina Bessa concorda que a forma dos profissionais da saúde informarem o diagnóstico pode ser ainda mais prejudicial para o quadro do paciente, mas Bessa enfatiza que é necessário dizer a verdade. “É claro que a verdade sempre deve ser mantida. Entretanto, é preciso cuidado ao transmitir a informação”, afirma a psicóloga, que sugere a aplicação do protocolo usado pela Associação de Medicina Americana (AAMA).

Família

Após o paciente tomar conhecimento do seu estado delicado de saúde, a oncologista Elza afirma que ele deve ter mais profissionais em uma consulta. “O lado sentimental é trabalhado a cada consulta, sempre em acompanhamento conjunto com psicóloga e a assistente social”.

Já com os familiares exige-se uma outra abordagem. “Geralmente, marcamos uma consulta com todos eles juntos com nossa equipe multidisciplinar, reunindo-os desde o diagnóstico e a cada novo passo do tratamento do paciente ou a cada insucesso com o passar do tempo”, esclarece a especialista.

Desestressar

Terapia é a recomendação doutora Bessa aos colegas médicos. “Todo profissional que trabalha com saúde deve cuidar de seu bem estar emocional, pois somente assim estará apto a ajudar quem o procura. Não significa que o médico deve visitar o terapeuta toda semana, nem todo mês, mas sempre que há uma necessidade”.

A oncologista confessa que ainda é difícil deitar a cabeça no travesseiro à noite após um dia complicado no trabalho, mas para desestressar ela costuma investir em atividades físicas. “Vou para o muay thai, musculação e também fico com o meu marido e minha família. Basta isso para me renovar”, revela a especialista Elza Gonçalves.

HIV

De acordo com o infectologista Silvio Fragoso, médico da Fundação de Medicina Tropical do Amazonas, quando o paciente chega no hospital e existe uma suspeita que ele tenha o HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana), o paciente recebe esclarecimentos. "A gente explica que, de acordo com os sintomas, existe a possibilidade dele ter o vírus e aconselhamos que faça o teste. É importante informar que o teste só pode ser feito com a devida autorização do paciente, ele deve assinar um termo. De certa forma, ele já fica preparado para os dois resultados iminentes: positivo ou negativo. Antes do resultado respondemos as dúvidas do paciente, depois explicamos sobre o acompanhamento laboratorial e disponibilizamos o serviço psicológico do hospital”.