RS: pelo direito de nascer com segurança

Muitas vezes é somente na hora do parto que se identificam eventuais problemas que demonstram a importância de o nascimento ocorrer no hospital. Foi o caso da assessora de eventos Daniela Pires de Aquino, que viu a filha Manuela receber nota 1 no teste de Apgar (método que mede a saúde do bebê ao nascer em notas de 1 a 10), a nota mais baixa do teste que evidencia bebês em condições que exigem auxílio médico especial. Isso ocorreu no Hospital de Clínicas, em Porto Alegre, no dia 27 de julho de 2012. Ela acredita que o atendimento e as ações adotadas pela equipe e a infraestrutura com a qual contou foram fundamentais para que a filha tenha sobrevivido.

De Guaíba, Daniela já iniciou o parto enfrentando o obstáculo natural de gestantes que residem em cidades sem maternidade: o deslocamento até a capital. Com quase 41 semanas de gravidez, ela foi levada para o hospital e aguardava por um parto normal, indicado pelo médico que fez o primeiro atendimento. Ao realizar alguns exames, o profissional identificou presença de mecônio, primeiras fezes eliminadas, e recomendou uma cesárea devido a emergência do caso, medida que certamente salvou a vida da criança. Manuela nasceu com parada respiratória e durante quatro minutos – uma eternidade em um caso como esse – precisou ser reanimada. Com sucesso, os médicos a trouxeram de volta.

“O pediatra não acredita que ela não tenha nenhuma sequela devido à gravidade do seu estado ao nascer”, afirma a mãe. As maiores garantias do ambiente hospitalar propiciaram aos médicos que atenderam Daniela e Manuela as condições para agir em tempo e tratar a criança, superando os problemas que ela só apresentou na hora de vir ao mundo.

Parto seguro é no hospital

Relatos como o de Daniela e da filha Manuela são exemplos da importância do debate sobre o parto seguro – defendido e ampliado pelos profissionais e pelas entidades médicas, como o Sindicato Médico do RS (SIMERS), pela Associação Gaúcha de Ginecologia e Obstetrícia do RS (SOGIRGS) e Conselho Federal de Medicina (CFM).

A preocupação das entidades é a preservação da vida, assegurando especialmente o direito do bebê nascer em segurança e da mãe vivenciar essa experiência com saúde para receber seu filho. É preciso considerar as estatísticas epidemiológicas, pesquisas e levantamentos científicos, bem como a opinião de especialistas, que indicam a importância de um ambiente assistencial que garanta à gestante a possibilidade de ter o seu bebê em condições adequadas.

Além disso, a categoria médica busca que medidas de segurança sejam direcionadas a mães e bebês, desde a gestação com o pré-natal, melhoria na qualidade da assistência neste período, realização de exames e agilidade nos resultados, qualidade dos ambientes de maternidades, bem como equipe especializada para atendê-la durante o parto com respeito à sua autonomia, contando também com apoio de infraestrutura com equipamentos e possibilidade de ser socorrida, sempre tendo em consideração as intercorrências que podem ocorrer durante o parto, como aconteceu com Daniela. A gravidez, que não era de risco, só teve um desfecho feliz graças a exames e procedimentos realizados dentro de um hospital. “Temos defendido a segurança ligada ao parto hospitalar. Estudos evidenciam um risco maior para o recém nascido fora de um espaço apropriado”, esclareceu a presidente da SOGIRGS, Mirela Foresti Jimenez.

As estatísticas citadas por ela, que é médica do Hospital Fêmina e professora das universidades federais de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) e do Rio Grande do Sul (UFRGS) nas áreas de ginecologia e obstetrícia, são alarmantes em países que possuem altas taxas de parto domiciliar – de 2 a 3 vezes mais mortes neonatais do que em partos realizados em hospitais.

No Brasil, uma pesquisa realizada por Almeida MF e companhia, com foco nos partos domiciliares acidentais, aponta um aumento da mortalidade fetal quatro vezes maior nestas situações. O trabalho, publicado na Revista de Saúde Pública, em 2005, sugere que, em procedimentos deste tipo, o risco de mortalidade neonatal também aumentou (quase o dobro). Estes resultados são semelhantes aos encontrados em estudos referentes a países desenvolvidos para o mesmo tipo de situação, mas não é possível analisar o cenário com dados mais abrangentes, pois não há estatísticas confiáveis em relação aos nascimentos em casa no Brasil.

Na contramão do que acontece em outros países, onde há um movimento de desestímulo e diminuição deste tipo de parto, no Brasil ocorre um incentivo ao parto domiciliar e em casas de parto. “Acreditamos que é preciso investir na qualidade da assistência obstétrica hospitalar e torná-la um ambiente mais confortável. É mais fácil tornar o ambiente hospitalar agradável e aconchegante para o momento do nascimento, do que tornar seguro o domicílio para a realização do parto”, acredita a especialista.

Brasil tem 4º pior taxa de mortalidade materna no mundo

O Brasil tem a 4ª pior taxa de redução da mortalidade materna no mundo (atrás apenas da Guatemala, África do Sul e Iraque), segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). Por conta disso, não conseguirá cumprir a meta de redução pactuada com a Organização das Nações Unidas (ONU) para 2015. O objetivo prevê que o país diminua em 75% as mortes maternas entre 1990 e o próximo ano, mas até 2013 esse número ficou em 43%.

Entre as principais causas de óbitos perinatal – aqueles que ocorrem durante a gravidez, no parto ou com o bebê de até sete dias – estão pressão alta, hemorragia e infecção, ocorrências que podem ser melhor tratadas no local adequado. Segundo o CFM, estima-se que 27% das mortes perinatais no mundo sejam intraparto, sendo mais frequentes nos locais com recursos limitados para atendimento às emergências obstétricas, corroborando com estudos científicos que comprovam que partos realizados em ambiente hospitalar têm menor risco de gerar complicações, o que representa menores taxas de mortalidade e de morbidade para mães, fetos e recém-nascidos. “Cerca de 90% desses óbitos maternos poderiam ser evitados por uma atenção em saúde adequada à mulher, desde o pré-natal até a realização do parto, sempre acompanhadas por médicos e em ambientes propícios à oferta de cuidados obstétricos e neonatais a fim de assegurar uma assistência segura ao parto, embasada nos melhores níveis de evidência e controle de intervenção”, esclarece a Recomendação nº 1.2012, do CFM, sobre parto seguro.

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